sábado, 17 de outubro de 2009

A trama de um vestido

"Uma brincadeira inocente, dessas de fazer você chegar em casa e não conseguir dormir. De quando mergulhar nos sonhos, afogar-se nos olhos, no nariz, na boca... na respiração. E ainda, quando acorda, pensa se um dia será real. Foi assim, em alicerces de candura, promessas, toques pequenos e sorrisos constrangidos que brotou nas veias uma necessidade de possuir.
Ele procurava alguém pra passar um tempo, ela só via o olhar dele em todos os lugares. Com essa frase, o resumo do que estava por vir, se faz depressa, sem demora. O que é visto e não sentido culmina em um fim; triste pra quem sempre só sentiu. "Mais uma" para quem apenas brincou. Pelo fato de que sentimentos eram fragmentos soltos dentro de si, fora de órbita, sem necessidade alguma de mutualismo.
Ela voltou, gritou, descabelou-se, perdeu a voz... perdeu a inocência. Se viu diante do espelho retorcida, sem a outra metade, sangrando pelas lágrimas e um forte "tum-tum-tum" que era o único som que preenchia o vazio dentro de si.
Depois de gastar todos seus esforços pensando no que foi com ele, no que é e no que será sem ele, decediu colocar sua roupa mais bonita, se achar linda outra vez e mandar tudo para o inferno. Trocou o sapato baixo por um salto, trocou seu casaco por um vestido curto. Se viu diante do espelho novamente, ainda assim, linda e impossivelmente sedutora, sentiu que ainda faltava alguma coisa. Quem sabe uma bolsa? Trocou, revirou, rasgou e picotou todos os tipos de bolsa. "Nada dá certo", pensou.
Tirou todas as ropas para fora, e descobriu um que ele tinha dado a ela. Colocou e se vestiu de saudades; ainda podia sentir seu perfume se espalhando no quarto. Se viu novamente imersa naquela gargalhada gostosa, naquele corpo no seu, naquela boca que pedia a sua. Depois desse impasse, se olhou no espelho e dessa vez, nenhuma gota saltou do coração-a-olho.
Deu uma risada sarcástica e ergueu o som. Um rock pesado deixou sua maquiagem tentadora demais para aquele rosto angelical.
Prometeu para si mesma que aquela noite seria a sua noite. Nada estragaria, nada estaria fora do seu alcance. Talvez, esse fosse o jeito mais sensato de aprender a se amar mais, de valorizar mais a cor dos seus olhos do que valorizar quem juraria que seus olhos fossem castanhos quando eram verdes.
 "Droga!", de tantos lugares que ele podia estar, lá estava ele. Voltou pra trás, caminhou depressa até o outro lado da rua, sentiu queimar a garganta de raiva. Foi enxugar os olhos para que as lágrimas teimosas, parassem de querer aparecer; olhou em um vidro que refletia sua imagem. Ele atrás dela, rindo com os amigos e olhando para todas as meninas que passavam. E ela chorando por ele não a olhar ...
Aquele rock que ouvira voltou. Fez suas veias ferverem, seus olhos ficarem lúgubres e, o céu estrelado, se transformar numa mancha cinzenta e obscura.
Deu meia volta, atravessou a rua. Jogou os cabelos e sentiu que seu perfume tinha se espalhado. Sorriu com essa sensação de poder. Tomou cuidado para que ele não a visse. Subiu as escadas. Quem a visse teria a certeza de que ela trocara as escadas do céu, pelas escadas do inferno: tentador e quente demais.. Aquele anjo deslizava sobre o chão e o seu balanço parava o universo.
Uma mão fria tocou o seu braço. Os olhos voltaram a ser um vulcão em erupição. Olhou devagar, quase que se não quisesse olhar.
Ele disse alguma coisa e depois sorriu. Ela cuidou para que quando o visse não deixasse a magoa voltar.
Seus olhos se chocaram, de uma forma violenta. Quando viu que era ela, seus olhos percorreram o seu corpo todo, e depois voltaram em extase para os olhos sedutores daquela doce e poderosa mulher.
Se ele soubesse que aquele vestido a deixaria tão sublime e subliminar, jamais a daria. Afinal, aquela menina não tinha despertado tanto o seu desejo como agora em forma de mulher.
Um sorriso devastador, fez ela virar e entrar no seu lugar de destino.
Dançou a noite inteira... E ele, bem, ele a olhou de longe.
Se você é responsável por aquilo que dominou algum dia, será para sempre, entre esses laços inquebraveis, de alguma forma ligado a isso. No balanço daquele vestido, contornando sua silhueta, se perdeu entre os abraços e beijos que agora não tinha.
Uma vez que o coração se torna incontrolável, impossível e indomável, a inocência deixa de fluir e passa a transformar a lagarta numa borboleta de cores vibrantes.
Ele poderia algum dia se deparar com as suas asas, com o seu perfume, mas não encontraria mais aquela menina que deixou para trás em busca de mulheres satisfatórias a seus desejos. Ele não poderia imaginar que a sua menina de outrora, era agora a mulher dos seus sonhos, e poderia até ser a mulher de muitos...
Mesmo sentindo uma parte sua faltando, e rasgando o vestido quando chegou em casa, ela se sentiu forte, e aquela dor foi aos poucos ficando leve. A sua força vinha do seu amor próprio. Seu pedaço estava voltando ao seu lugar de origem.
Suas asas ganharam novas viças, e seu olhar mesmo que sedutor para aquela menina interna, não deixou de cultivar por onde foi novos perfumes e olhares. A falta que sentia ainda, não era maior do que seu desejo por ser dessa vez, dona do seu próprio vestido.
Ele a encontrou algumas vezes, sem coragem nenhuma para conversar, ou apenas perguntar se ela estava bem. Depois de um tempo, naquela mesma rua, se sentindo poderosa, atravessou sem olhar a rua. Um farol cegou seus olhos, seu corpo caiu abruptamente no chão. Anjos, não possuem poder de alterar o imprevisto... Tudo agora estava em outro angulo.
Esse ainda não era o seu fim; ao abrir os olhos cheios de confusão, viu sobre ela, asas brancas de um menino que também de transformara em um homem, lhe trazendo a paz em um sorriso perfeito."


Eliandra C. M.

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