domingo, 4 de outubro de 2009

Unhas Vermelhas

Os passos de pluma, atrás da porta, aceleraram a sua respiração.
Mas ele ficou na  indecisão. Bater e pedir licença, abrir com força e não dizer nenhuma palavra, voltar atrás e esquecer tudo. 
O efeito desse tempo, fez quem estava do outro lado da porta apertar forte o travesseiro, colocando- o contra a face, na tentativa de amenizar os batimentos do coração e sua respiração. Poderia ficar assim até adormecer; no outro dia isso não passaria de um sonho.
O ranger da porta a fez apertar os olhos deixando escapar uma lágrima estúpida que molhou o travesseiro. Poderia ter começado a chover uma hora antes, mas começou justamente naquela hora. Ficou esperando os passos se aproximarem, rolando os olhos para todos os lados sem de virar para porta e ver a sua sombra.
O que era certo, era certo. Não podia cometer o pecado, se queria ser absolvida de seus erros anteriores. Não podia deixar o desejo queimar nas raízes do ventre saindo pelas unhas vermelhas, exalando no quarto escuro o perfume da inocência. Não podia olhar para a sombra e ver a sua porta o que mais queria, não podia ceder a tentação. Depois de todas as dores causadas pelo sentimento de perda, se conformar com o que estava planejado era a saída mais fácil. Na verdade, o mais fácil estava longe de ser a felicidade que sonhava... Mas se submeter ao difícil quando não se sentia forte o suficiente para continuar, estava fora de cogitação. Pensou um momento pelo corpo que tinha sede. Sede daquela chuva que caia devagar molhando aos poucos a janela, sede daqueles olhos se fechando no grito interno, tinha sede daquela sombra.
Esses pensamento foram interrompidos quando a porta rangeu de novo. Seus olhos se abriram rapidamente e apertou mais forte o travesseiro. Queria correr até lá e se jogar. Queria mesmo, era poder dizer, com aquele mel nas cordas vocais:
- Entra...
Mas era o que ela queria e não o que podia. Escolheu fazer tudo certo dessa vez; sem quebrar regras, sem jogos com cartas marcadas.
Mesmo o amando sem objeção a sua figura perfeita que fazia, não podia cometer o suicídio da sua alma agora que tinha um caminho à seguir.
Tudo foi desfeito, como lã na pata de gato, quando um passo calmo se aproximou da cama onde a bela moça tentava o suicídio, agora com as mãos na cara. O perfume que saia daquela alma de trajes brancos, fez com que ela tirasse as mãos do rosto devagar e se deixasse levar pela fragância venenosa.
- Eu estou livre.
Foi só o que ele disse, para depois desse deslize, desse pecado deixar de lhe apunhalar, virar o fruto proibido que mais gostava de saciar. Do pecado ao certo. A liberdade que ele trazia em suas mãos, foi o que a impulsinou a segurar firme e entrelaçar naquela escuridão o seu corpo contra o dele. Pode ver, quando um raio clareou aquele quarto, as suas unhas vermelhas descer pelo cabelo negro apertando sua nuca contra o seu pescoço. Deixou que a libertação que ele trazia em uma bandeja saciasse a dor daquele pecado que agora não existia mais.
Respirou fundo; sentiu, naquele momento, quantos efeitos poderiam levar o coração a acelerar. Talvez, o que ele mais queria sentir eram suas unhas vermelhas. Mas o que ela tinha certeza que queria, era que aquela sede que sentia fosse como a chuva que caia lá fora...

Nenhum comentário:

Postar um comentário